31 de março de 2020

DIÁRIO DE UM TEMPO DE MEDO XIX

Agora que a avaliação dos alunos terminou e o Teams funcionou na perfeição, depois de uns minutos de stress (a tecnologia não corresponde quando mais dela necessitamos!), é momento de paragem para contemplação.
Agora, o mundo, o meu pequenino mundo, é observado através das janelas e do alto do terraço.
Olho pelas janelas e continuo a ver vizinhos do prédio de trás que desconhecia até ao momento. Uns que vêm pedalar para a varanda, outros que vêm para a relva jogar à bola, outros que sacodem o pano do pó, outros que vêm, apenas, ver o tempo passar. Os vizinhos do meu prédio, esses não os vejo. Não saio, não me cruzo com eles. Apenas os ouço.
Do lado da frente do prédio, do meu terraço, vejo passar o comboio. Vazio. E isso leva-me a momentos de meditação. 
O que pensa o maquinista enquanto o conduz? 
O que pensa o guarda da passagem de nível ali sozinho o dia todo?
O que pensam as pessoas que ainda vão passando na rua?
E olhar a paisagem com outros olhos, um olhar mais lento porque mais lento é o tempo, também contribui para que mais pensamentos me ocupem a cabeça.
Os passarinhos voam e atravessam os campos em liberdade. Trinam logo de manhã cedo, numa orquestra afinada, indiferentes a tudo. As pombas continuam a fazer ninho e a viver no alto do prédio (conquistaram o condomínio que é delas por teimosia), a atravessar o terraço em direção ao telhado e a arrulhar indiferentes às pessoas, aos vírus, à chuva ou ao sol. Os cães dos vizinhos estão calmos, não se ouvem.
E toda esta calma é apenas aparência. Esta sensação de férias é pura aparência.

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