21 de fevereiro de 2017

QUE VACA TEIMOSA!

- Professora, nem vai acreditar, mas é verdade. Deparámo-nos com uma vaca, no meio da estrada, que impedia o carro de avançar. Saímos para a afastarmos e, por incrível que pareça, ela olhou-nos ameaçadoramente e falou-nos:
- Sou vaca sagrada, chegada da Índia na armada de Vasco da Gama. Não podeis tocar-me senão cai-vos um raio em cima!
- E eu fiquei ali, argumentando, que tivesse dó, que eu levaria raspanete, que a professora marcaria falta… Mas ela era teimosa!!!
Desafio Escritiva nº 17 – desculpas criativas

13 de fevereiro de 2017

FUTURO ROBÓTICO

A polémica instala-se. A discussão gera confusão. 
Aceito, naturalmente, a mudança, desde que não me despedace o coração de susto. Tão simples quanto isso. 
Estou preso no passado? Não. Esse futuro sem luz, sem uma nesga de emoção, rejeito-o. Todo o saber lá estará, mas… juntando-lhe frieza e inteligência artificial, pisados ficarão os sentimentos. 
Nem este trevo de quatro folhas me faz prever um destino afortunado para a humanidade. 
Não, não quero viver neste futuro robótico anunciado!

3 de fevereiro de 2017

O QUE ACABEI DE LER

Foi o primeiro livro de Sándor Márai que li. Vou procurar outros.
A herança de Eszter é um livro que provoca um forte impacto. Nele moram personagens densas cujas vidas descruzadas, e por isso mesmo constituem toda a trama, nos deixam, a nós leitores, com a coração a bater fortemente, o cérebro num rodopio, e os olhos a observarem as pessoas que nos rodeiam. ´
Lealdade vs traição, honestidade vs manipulação e falsidade, amor e amizade vs interesses materiais.

O primeiro capítulo: 
"Não sei o que Deus ainda me reserva. Mas antes de morrer quero escrever a história do dia em que Lajos veio ver-me pela última vez e me roubou. Há três anos que venho adiando estes apontamentos. Agora sinto como se uma voz, contra a qual não posso defender-me, me exortasse a escrever a história desse dia – e tudo o que sei acerca de Lajos – porque esse é o meu dever, e já não tenho muito tempo. Uma voz assim é inequívoca. Por isso obedeço, em nome de Deus. 
Já não sou jovem nem tenho saúde e, em breve, terei de morrer. Talvez devido ao tempo, que não me perdoou, talvez devido às recordações, tão cruéis como o tempo, talvez por um particular estado de graça que, segundo os ensinamentos da minha fé, também toca por vezes os indignos e destinados, talvez, simplesmente pelo peso da experiência e da velhice, olho a morte de frente, com serenidade. Presenteou-me a vida maravilhosamente e, implacavelmente me despojou...o que mais posso esperar? Tenho de morrer, que isso é a lei, e porque cumpri o meu dever. 
Sei que palavra é esta e, vendo-a agora, escrita, sinto-me um pouco intimidada. É uma palavra arrogante, pela qual vou ter de responder, um dia perante alguém. Demorei algum tempo a reconhecer qual o meu dever e obedeci, contrariada, sim, uivando e protestando desesperadamente. Senti, então, pela primeira vez, como a morte pode ser redenção, e soube, também, como a morte é resgate e paz. Que estranha foi essa luta! Quem me obrigou e porque não pude esquivá-la? Tudo empreendi para escapar dela. Mas o inimigo vinha atrás de mim. Agora já sei que não podia ser de outro modo. Estamos ligados aos nossos inimigos e eles também não podem fugir de nós.”

E quase no fim:
“O sentido moral, vês, não é algo de hereditário, mas uma característica adquirida. Os homens nascem sem moral. O sentido moral dos selvagens ou das crianças é diferente da moral de um juiz de sessenta anos do Supremo Tribunal de Viena ou de Amsterdão. Adquire-se o sentido moral durante a vida, tal como de adquirem maneiras e cultura. – Falava em tom de padre, como um especialista. – Há homens cujo carácter é fortíssimo, sim, são uns génios do carácter, tal como há grandes músicos e poetas. Tu és assim, Eszter, um génio do carácter; não, não protestes! Foi o que senti em ti. Eu, em questões de moral, sou um surdo, quase analfabeto. Por isso, refugiei-me em ti; creio que, sobretudo, por essa razão.”  pág. 121/122

2 de fevereiro de 2017

MALDITOS TODOS OS VÍCIOS!

Acordou com o sol impertinente a agredir-lhe o rosto queimado, como já acontecia há meses. Desde que perdera tudo, a praia era a sua casa. 
Maldita bebida, maldito jogo, malditos todos os vícios! 
Teve sorte. Naquele dia, um ser misericordioso (parecia ter caído do céu!) viu-o e estendeu-lhe uma mão. 
- Queres mudar? – perguntou-lhe, apenas. 
No dia seguinte, Rafael iria mudar o rumo da sua vida. Entretanto, esperou pelo sono. Talvez lhe trouxesse a paz há muito fugida. 

1 de fevereiro de 2017

A QUINTA DOS ANIMAIS

A fábula A quinta dos animais, ou O triunfo dos porcos, como aparece, também, traduzida em português, é uma metáfora política muito bem urdida. 
Apesar de ter sido publicado em 1945, o livro é de uma atualidade admirável: os animais de uma quinta revoltam-se contra a tirania do seu dono, mas rapidamente o idealismo e a democracia dão lugar à mentira e a uma nova forma de ditadura. 
Mordaz e cheio de perspicácia, George Orwell faz o leitor olhar para o mundo atual e ver o que nele se instalou, para ficar: manipulação, corrupção, sede de poder, ganância pessoal sobreposta ao interesse comum, enriquecimento rápido da minoria em contraste com empobrecimento alarmante da maioria. 
E é a este nível que chegam os novos “governantes” da quinta, os porcos. Para eles deixa de haver limites e as mentiras em que envolvem os outros animais passam a ser a sua verdade. Lendo este pequeno grande livro, o leitor revê o passado e vê o presente ocupados com loucos que têm ascendido ao poder e causado destruição. Então, imagina um futuro negro porque a história é cíclica e repete-se. A quinta dos animais é o livro onde a ficção toca a realidade nua e crua.

Comentário publicado pela revista Visão, na rubrica "Ler faz bem" 
(comentários dos leitores)