18 de maio de 2020

DIÁRIO DE UM TEMPO DE MEDO LIV

Pois agora que estamos na segunda fase do desconfinamento, ou lá o que isso seja, é muito bom, assim se finta o bicho que se julga mais esperto que a gente, e a gente gosta tanto do mar e da praia, até somos um país de marinheiros que muito se esforçaram para que o mar fosse nosso, e foi um regalo, ontem, que o sol até veio fazer a festa e brilhou muito e aqueceu o tempo e nem deixou que o vento viesse incomodar e, como estava a dizer, foi um regalo mergulhar o pezinho na areia e molhá-lo no mar, e a gente também gosta muito de esplanadas e de se sentar numa para saborear o belo do pastel de nata com a bela da meia de leite ou a rica cervejola com uns amendoins e uns tremoços, há lá coisa melhor, como pode o bicho impedir a gente de ter tudo isto, que se lixe o bicho, parece tolo, vá lá para a terra dele, que a gente aqui não o quer, onde se viu isso, roubar-nos os prazeres, impedir-nos de estarmos na rua todos juntos a falar mal dos vizinhos e a fazer queixa do governo que agora até nem dá para falar mal dele, o governo anda bonzinho, até nem vai entrar em austeridade e até vai apoiar os laiofes, ou lá o que isso é, e até aumentou os salários com uma percentagem quase tão pequena como o bicho que ninguém a viu, e como a gente deve evitar aglomerações, até deu jeito fazer uns piqueniques, afinal a gente tem tantas matas como mar, e é tudo ao ar livre, não há mal nenhum nisso, não há nada como umas geleiras cheias de cerveja e coca-cola e rissóis e bolos de bacalhau e o tacho do arroz embrulhado num cobertor, no jornal agora não, porque agora não dá jeito sair de casa para ir comprar o jornal, por causa do Covid!
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Ora então levai lá o recado que não é da Guidinha* que já cá não anda há muito tempo, mas é de uma prima afastada.

* referência às Redações da Guidinha, de Luís de Sttau Monteiro

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